19.11.06

.remetente: Laura Melo.

por Laura Melo; diretamente de Recife, pe.

.recife dá o tom.

por Fabiana Santiago

Foram precisos poucos dias de viagem para descobrir que a capital pernambucana é um poço de cultura. Além de sempre inovar na música e na arte, revela apurados gostos de moda – misturando o urbano e o regional, sem enfado. Do criar ao vestir, a cidade inspira atitude: na cultura de brechó, no entrelace de estilismo com outras disciplinas, na articulação da moda autoral e
no reconhecimento local e nacional de seus representantes.
Não é raro ver alguém num vestidinho floral dizendo com orgulh
o, quando perguntado: é de brechó e foi dez reais! Em todo canto têm bazares de segunda-mão, que vendem de tudo um pouco, de roupas a vinis. O melhor é que as roupas geralmente são funcionais, sem aquele exagero retrô, e de qualidade. O que chama atenção também é que toda moça esperta leva seu casaco na bolsa (às vezes esfria mesmo!) e arremata com uma echarpe herdada ou garimpada.
Brecholices à parte, está constatado que quem é vivo inventa, pois até quem não vem de moda arregaça as “manguitas” para costumizar. Um bom exemplo da junção de moda e outra disciplina é a estudante de Artes Plásticas (UFPE), Laura Melo, que de vez em quando estampa camisetas com suas criações e converte elementos inusitados em roupa; em suas mãos, toalhas redondas de mesa viraram divertidas saias-godê que bailaram este ano no carnaval olindense.
Falando da vizinha turística, Olinda, dizem que é preciso ver Recife lá de cima, do Alto da Sé. Buscando esse destino, sobem-se as ladeiras coloridas, as mesmas do frevo e do maracatu, para encontrar simpáticas tapioqueiras, lojinhas de artesanato, bares aconchegantes e, o principal, charmosos ateliês de gente que existe para criar e o faz com intuição e liberdade no seu próprio cantinho. Pelo menos uma vez por ano, todos se reúnem no evento “Arte em toda parte” para incentivar e disseminar suas produções.
Voltando à cena recifense, novas marcas vão buscando aos poucos adentrar o circuito comercial, provando que talento e diferença são o estopim do sucesso. A Madame Surtô, grife de Thaís Asfora valoriza a feminilidade em roupas atemporais e no toque de exclusividade das etiquetas decoradas. O carro-chefe de sua produção é o vestido. Joana Pena e Camila Guedes conduzem com sensibilidade a Quem-te-vestiu, que exala um toque naïf através de apliques e peças de formas soltas. A Maria da Silva – das moças Rita Azevedo e Germana Valadares – é uma ode à mulher brasileira: simples e forte, tanto no nome quanto nas roupas. Elas manuseiam cores e texturas, do algodão ao tafetá, para dar suporte às temáticas regionais e/ou artísticas.
Estilista consagrado no país pelo uso do artesanato local em suas criações (muito antes disso virar tendência), Eduardo Ferreira considera fundamental o resgate da identidade cultural brasileira na construção de uma moda originalmente autoral. Em seus quinze anos de carreira sempre reservou tempo para estudar a história da indumentária e considera importante destacar as funções do estilista e do criador, sendo este o que se utiliza da iconografia para tecer identidades e aquele o que decodifica tendência visando o mercado. Atualmente, Eduardo se divide em vários, desenvolvendo figurinos, prestando consultoria a empresas do Agreste e trabalhando em seu ateliê de alta-costura.
Outro pernambucano brilhando no cenário nacional é Melk Z-Da, que teve de amadurecer seu talento, evoluindo de desenhista em loja de tecidos para revelação do Fashion Rio 2005 em apenas três anos. Melk recheia suas criações com referências da própria infância, em que colecionava insetos, e de uma espécie de enciclopédia de imagens, músicas e filmes que ele atualiza freqüentemente. A propósito, o nome diferente é de origem judaica.
Existem vitrines especializadas em garimpar e divulgar os novos-velhos talentos da cena pernambucana e brasileira, tais como: Abajour Lilás (Galeria Joana D’arc), Bendito Fruto, Moda Nacional (Paço Alfândega) e Avesso (Graças). Todos aqui citados – lojas, criadores, estilistas e expectadores – se juntam para engrossar o coro dos amantes de moda que pedem: menos tendência, MAIS CRIATIVIDADE!!!