30.9.06

.de ourela em pé: Coco Chanel andou de circular 1!


por J'opis Azevedo

Linha Circular 1, tarde de fevereiro por volta das dezesseis horas; cruzamento entre as avenidas Barão de Studart e Antônio Sales, na parada do Lacen. Eis quem sobe pela porta de entrada do ônibus: Coco Chanel!
Uma silhueta franzina, de porte mediano-alto, calçando um bicolor com rubro artelho à mostra. Saia plissada longa cobrindo os joelhos, em tons terrosos, blusa em Jersey preta, com mangas 3/4, colar e brincos de pérolas, bolsa de couro preta, tamanho médio, com fivelas e correntes douradas carregada em punho. Maquiagem discreta com resíduos de pó-compacto, exalando uma leve fragrância floral, que evocava os odores de infância, e logo encheu o ambiente do veículo, onde sabemos que odores acres costumam surgir de modo cruel, ferindo as narinas de passantes-passageiros.
Os cabelos curtos , quimicamente modificados, numa coloração entre “Asa de Graúna de Iracema” e “Dondoca-play frequentadora do Eden Club”, deixavam a mostra uma tênue cor branca na raíz de alguns, denunciando a idade, que deveria oscilar entre sessenta e setenta. Não seria educado entregar a idade de “Mademoiselle”. A entrada pela frente do ônibus é permitida para pessoas com mais de 65 anos.
Deslizando elegantemente, apesar dos solavancos do veículo, nossa Chanel, sentou-se naquele assento de fibra ou poli alguma coisa. Não perdeu a pose. De onde me encontrava pude registrar nas “minhas fatigadas retinas” de estudante de estilo, após uma exaustiva aula de Modelagem Plana Feminina, aquela figura ímpar saída dos livros de História da Indumentária, de uma revista antiga, relíquia deixada pela mãe de um amigo e que me fora presenteada. Revival ou vintage legítimos!
Num instante súbito, de repente, não mas que de repente! Uma representante das tribos urbanas contemporâneas vem sentar-se ao lado de nossa Demoiselle. A jovem parecia extasiada, espantada, estágio de encantamento diante de CC. A menina de calças largas, cheias de bolsos e correntes, mini blusa preta silkada com o Piu-piu, “piercing” no umbigo, braceletes com pinos, cabelos com tintura ruivo-fogo e algumas mechas em azul, parecia não compreender aquela imagem não virtual. Estranhamento puro! Encantamento. Epifania Clariceana!!! (cf Clarice Lispector).
Chanel, graciosamente deu o sinal para descer na parada seguinte, próxima ao Hospital do Exército, na avenida Desembargador Moreira. Agradeceu ao “Monsieur Conducteur” e desceu levitando como entrara.
A jovem contemporânea-anime-japonês seguiu-a com um olhar, como alguém que não acreditava no que acabara de ver. Casual? Virtual? Museu em movimento? Muitos links para serem feitos numa cabecinha tão nova.
Desci pensando no mistério do signo-roupa-indumentária, num veículo pop como o “bus-omnibus-buzão”...Puro encantamento-estiloso. Valhei-me São Baudrillard, São Lipovetsky e São Barthes.

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